Síndrome unha-patela
A medicina se beneficiou muito dos avanços ocorridos nas últimas décadas. Impulsionado pela tecnologia, esse avanço significa, na grande maioria dos casos, maior qualidade na prevenção, diagnóstico e tratamento de uma série de doenças e condições.
No entanto, mesmo diante desse quadro, a comunidade que trabalha direta ou indiretamente com saúde ainda está descobrindo novas doenças, algumas delas raras, isto é, com baixa taxa de incidência na população como um todo ou em subgrupos populacionais, com poucas alternativas de tratamento. Este é o caso da síndrome unha-patela.
Caracterização da doença
A referida síndrome consiste em uma doença rara, com caráter autossômico dominante e causada por mutação no cromossomo 9, mais especificamente no gene LMX1B. Suas principais características são alterações congênitas que se manifestam no tecido muscular, no tecido esquelético, nos rins, na pele (distrofia das unhas), nos olhos e no sistema gastrointestinal.
Para se ter ideia, apesar de não haver dados específicos do Brasil, estima-se que essa síndrome atinja 22 entre 1 milhão de habitantes na Inglaterra, sendo que nos Estados Unidos esse número é ainda mais baixo: apenas 4,5 habitantes a cada 1 milhão, não havendo dados significativos que indiquem a síndrome tem predileção por etnia ou sexo.
Esse conjunto de sintomas leva a diversas queixas dos pacientes com a síndrome, sendo a mais comum a queixa ortopédica, caracterizada pela dor e instabilidade patelar – osso situado na parte da frente do joelho, que tem como principal função a proteção da articulação aí localizada –, capaz de levar à limitação funcional.
O tratamento dessa queixa é de extrema importância e deve ser feito o mais cedo possível, pois costuma ser percebido quando a criança começa a caminhar e pode evoluir para um quadro mais grave, conhecido como artrose precoce fêmuro-patelar, que além de limitar ainda mais a pessoa com a síndrome causa dor intensa.
Apesar dos sintomas da síndrome variarem muito conforme o paciente, grande parte dos sintomas descritos estão presente em todos os pacientes que, devido às limitações que têm que encarar no dia a dia, geralmente são acompanhados de quadros de ansiedade ou mesmo depressão, reforçando a importância de uma equipe médica multidisciplinar para a realização do tratamento e acompanhamento desses pacientes.
Literatura médica sobre a doença
Apesar de haver diversas patologias associadas à síndrome unha-patela, com glaucoma e glomerulosclerose focal, grande parte da literatura focada no assunto se concentra no campo ortopédico, mais desenvolvido tanto em termos de literatura quanto em termos de tratamento, e por isso ele será abordado neste artigo.
Como dito acima, a principal queixa ortopédica dos pacientes é a instabilidade patelar associada à dor e limitação funcional, e em relação ao tratamento e acompanhamento, há uma série de divergências entre os médicos.
Partes dos especialistas recomendam apenas o acompanhamento médico, sem necessidade de intervenção cirúrgica, pois em sua visão os resultados das cirurgias são pobres, ou seja, possuem mais desvantagens do que vantagens. Além disso, essa posição é reforçada com argumentos de que essa deformidade na região do joelho é benigna e em muitos casos não causa dor.
Já outro grupo de especialistas defende a intervenção cirúrgica para corrigir, mesmo que em partes, a deformidade no joelho, pois acreditam que essa correção é capaz de fornecer maior qualidade de vida aos pacientes. No entanto, ressaltam que só é eficaz quando feita em crianças menores de 8 anos, pois após essa idade a cirurgia não só possui baixos níveis de eficácia, como também pode piorar os sintomas de forma progressiva, levando à fraqueza no quadríceps e aumento da limitação funcional.
A cirurgia de realinhamento patelar é feita por meio da liberação das partes moles laterais presentes no osso do joelho, pois isso além de realinhar a patela ainda diminui a luxação causada pelo movimento de caminhar, que é a principal causa da dor e da depreciação progressiva da patela.
No entanto, em crianças esqueleticamente maduras e em adultos, que já apresentam um quadro avançado de luxação da patela, é necessário recorrer a outras técnicas cirúrgicas para realizar o alinhamento da patela. Nesses casos, é feita a transferência do tendão semitendíneo por meio de um túnel na patela, uma vez que o principal objetivo desse procedimento é aumentar a força do vetor medial.
Outra alternativa de tratamento cirúrgico, adotada nos casos em que a evolução da deformidade no longo prazo ocorre de maneira acentuada, é a patelectomia. Trata-se de um procedimento de exceção, feito em casos muito selecionados e para os quais as alternativas anteriores não tiveram o resultado esperado. Nesta cirurgia, é feita a retirada total da patela, que leva a perda de força e, em grande parte dos casos, à distrofia simpático reflexa. Dessa maneira, somente profissionais especializados podem recomendar qual a melhor abordagem a ser seguida no tratamento da instabilidade patelar.
Assim, independente do sintoma a ser tratado, seja disfunção muscular esquelética, seja disfunções na visão, no sistema gastrointestinal ou nos rins, na síndrome unha-patela o que realmente importa é que o diagnóstico seja feito o mais cedo possível, pois dessa maneira é possível otimizar o tratamento, levando a melhores resultados, uma vez que em adultos os sintomas tendem a evoluir desfavoravelmente.