Para entender o que é o AI-4, há dois elementos que precisam ser observados. Um deles é a cultura política brasileira, outro é o comportamento, até mesmo curioso, do regime autoritário que se instalou no país em abril de 1964.


O Golpe de Estado levado a cabo por civis e militares, em abril de 1964, é um episódio que encontra seu contexto histórico no advento da Guerra Fria, forma como a historiografia convencionou chamar a corrida armamentista e a disputa por influência política e econômica travada por Estados Unidos e União Soviética.

Aliados na Segunda Guerra Mundial, evento que trouxe uma nova configuração ao mundo civilizado, os dois países seguiram caminhos distintos. Enquanto a União Soviética seguia o caminho do socialismo, impondo a outras nações do leste europeu mais pela força do que pelo convencimento, os Estados Unidos desenvolviam mecanismos sofisticados de dominação por meio da submissão econômica.

Sob esse guarda-chuva político e econômico norte-americano estavam os países de toda a América Latina, incluindo o Brasil. Por outro lado, o continente, principalmente o Brasil, começava a ensaiar uma escalada industrial, bastante presente no Estado Novo, comandado por Getúlio Vargas, e no governo de Juscelino Kubitschek. O fortalecimento econômico e a autonomia política da América Latina nunca foram bem vistos pelo império do norte, uma vez que isso lhe suprimiria uma zona de influência e controle importante no tocante à geopolítica estadunidense.

No âmbito da Guerra Fria, os Estados Unidos tinham outras razões para se preocupar. Fortemente reprimido durante o Estado Novo, o movimento comunista no Brasil tinha pouca força. Mesmo assim, o “fantasma comunista” era um elemento útil para manobrar a opinião pública. O Golpe civil-militar de 1964 seria apoiado por amplos setores da imprensa, aliada às elites econômicas do país, desde sempre alinhadas com interesses externos e preocupada com o viés mais à esquerda de João Goulart, que também não era bem visto pelo governo estadunidense.

Do AI-1 ao AI-4

A ameaça comunista foi o mote para o movimento que se materializou na noite de 31 de março de 1964, quando teve lugar a derrubada do governo João Goulart. Diziam os militares no comando do movimento que a intervenção autoritária era temporária, mas, ao contrário, o que houve foi o recrudescimento de um regime que foi se instalando em doses homeopáticas.

O AI-4 é um sinal claro da preocupação com o verniz institucional, que os militares tentavam conferir às ações de indisfarçável cunho autoritário. Haveria quem, naquele período, pudesse não suspeitar que o país vivia numa ditadura.

Para contextualizar melhor o AI-4, convém fazer uma reconstituição dos Atos Institucionais anteriores, que foram os instrumentos de consolidação dos regimes, conferindo cada vez mais poder ao executivo instituído pelo golpe de Estado.

O AI-1 foi editado no dia 9 de abril de 1964 por uma junta militar que se dizia provisória, mas que dava à referida junta o poder de mudar a constituição, cassar mandatos legislativos, suprimir direitos políticos por 10 anos, demitir por disponibilidade ou aposentar compulsoriamente pessoas que atentassem contra a segurança nacional, o regime democrático e a probidade na administração pública.

Efetivamente, esse arcabouço, em que se destaque a ironia da proclamação do regime autoritário como democrático, criava as condições típicas para a perseguição política.

O AI-2 foi editado para instituir a eleição indireta para a Presidência da República, revogando o previsto na Constituição democrática de 1946. Além disso, conferiu ao presidente a prerrogativa de decretar estado de sítio por até 180 dias sem consultar o Congresso. Através de vários Atos Complementares, suprimiu direitos políticos, criminalizando políticos cassados que se pronunciassem contra o regime.

O AI-3 estendeu aos estados e prefeituras a mão pesada do regime, suprimindo as eleições para governador e conferindo ao nome máximo dos executivos estaduais a nomeação dos prefeitos.

Enfim o AI-4

A finalidade do AI-4 foi dar um verniz de institucionalidade a uma nova Constituição, que englobava todas as mudanças impostas pelos Atos Institucionais anteriores.

Não sem protesto dos parlamentares, inclusive os da Arena, que seria o bloco de apoio ao governo, os militares enviaram o projeto da nova Constituição estipulando um prazo um pouco superior a um mês para que a mesma fosse promulgada pelo Congresso Nacional.

Não há qualquer dúvida de que tal prazo era incompatível com tarefa de tal envergadura. O que se propunha, na verdade, era que o Congresso se curvasse à vontade do Regime, que foi o que aconteceu, já que o documento foi aprovado com poucas e insignificantes mudanças.

Em 24 de março foi promulgada, se é que esse termo possa parecer correto, a Constituição de 1967, cujos principais pontos legitimavam o regime de força, controle e submissão ao poder central.

O presidente seria eleito indiretamente por um Colégio Eleitoral, em sessão pública, para cumprir mandato de quatro anos. O documento conferia ao Poder Executivo, a prerrogativa de cassar e suspender direitos políticos; estabelecia que só poderiam haver dois partidos (MDB e Arena); determinava a eleição indireta para governador e prefeito; restringia o direito de greve; instituía pena de morte para aquilo que bem entendesse o regime ser crime contra a segurança nacional e aumentava o poder da Justiça Militar.

Posteriormente, em 1968, seria editado o draconiano AI-5, como instrumento de enfrentamento à crescente revolta popular. A Constituição de 1967, o AI-4, continuou em vigor até o final do regime, que só ocorreu em 1985.

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