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Superação do Liberalismo

Um dos maiores desafios do século XXI, entre tantos outros, como a preservação dos recursos naturais e das condições de vida na Terra, temas que não podem estar ausentes de uma abordagem econômica, é a busca de paradigmas que norteiem a economia.

Tais paradigmas devem, ou deveriam, levar em conta o fator humano, colocando-o no centro do debate, sob a pena de levar a humanidade a trilhar caminhos que vislumbrem soluções parciais e excludentes.

O liberalismo é acusado sistematicamente de ser responsável por trazer, no lugar da prometida riqueza, miséria, pobreza e devastação. É o que garante o filósofo francês Dany-Robert Dufour, um crítico ferrenho do liberalismo, autor de “Le Divin Marché” ( O Divino Mercado ) e L´individu qui vient…aprè le libéralismo (O indivíduo que vem depois do liberalismo).

O que é Liberalismo e seu contexto histórico

Para que se possa iniciar uma reflexão sobre a legitimidade da afirmação de Dany Robert Dufour, é preciso, primeiro, entender o que é o liberalismo e em que contexto histórico ele surge e evoluiu.

Dissemina-se uma crença acerca do liberalismo de que sua pauta inaugural é o combate ao poder opressor do estado monárquico, que dominava o sistema político europeu no final do século XVIII.

Há um equívoco nessa crença, causado pela proximidade do surgimento do liberalismo com o apogeu do iluminismo, de Rousseau, Montesquieu e Locke, que culminaria na Revolução Francesa.

Por outro lado, os ideais iluministas contribuíram para criar um ambiente favorável para o surgimento da ideologia liberal, voltada para a economia, e, mais que isso, tendo sido a primeira abordagem científica do fator econômico.

Enquanto o iluminismo se focou em ideais de liberdade, fraternidade, democracia e direito, o liberalismo se ocupou de formular uma teoria econômica, que se contrapunha ao mercantilismo como base da produção e acúmulo de riqueza. Curiosamente era a economia baseada na circulação de mercadorias que sustentava o poder e o sistema monárquico. Adam Smith, considerado até hoje o principal teórico do liberalismo, prega que o alicerce para a produção das riquezas é o trabalho.

Na visão de Smith, é a liberdade para produzir que faz o homem se harmonizar com seu potencial natural de gerar benefícios para si e para a sociedade. De acordo com o ideal liberal, a ausência de interferências externas na economia propicia o ambiente perfeito para que as forças econômicas se autorregulem, produzindo salário para os trabalhadores, lucro para o empresário e satisfação para o consumidor.

Paradigmas como as leis da oferta e da procura e da livre concorrência estão intimamente ligados ao receituário liberal, muito embora sejam plenamente aceitos pela esquerda do século XXI.

O problema é que o Deus Mercado fracassou no curso da revolução industrial ao cumprir somente parte da promessa. Gerou lucro, provocou a migração do campo para a cidade de trabalhadores em busca de oportunidades, mas a realidade é que o trabalho era precário e as condições de vida idem, abrindo caminho para duas correntes e para os conflitos de classe que recrudesceriam no século XX.

O liberalismo social surgiu como uma tentativa de correção e adequação do ideal liberal aos novos tempos, conferindo ao estado um papel regulador e disciplinador das relações entre as forças econômicas, no sentido de garantir oportunidades reais a todos, oferecendo educação, saúde, emprego e outros valores. O determinismo econômico, por sua vez, com base na crença de que nada acontece sem uma razão, propôs algo mais radical, pensando o estado como indutor da economia. A versão mais radical foi a revolução socialista na Rússia, que abriu caminho para os regimes comunistas.

O liberalismo, refinado ou não, na visão de Dufour, libertou a humanidade de duas experiências incômodas: o nazismo e o stalinismo. No entanto, a exacerbação do liberalismo criou a ditadura dos mercados. Na visão do filósofo francês, a ditadura do mercado levou o mesmo a ocupar o espaço que era reservado às relações políticas, sociais e culturais.

Na visão do historiador húngaro Karl Polany, a Europa atual é um exemplo de como os mercados substituíram o poder político. Quanto mais se aprofunda a crise, mas os políticos abrem mão do poder em favor dos mercados. Esse processo teve início, na visão dos historiadores, no início dos anos 80, com a chegada ao poder de Margaret Thatcher, na Grã-Bretanha, e de Ronald Reagan, nos Estados Unidos, que suprimiram a regulação das economias locais, desconstruindo todo o equilíbrio nas relações sociais construído ao longo do século XX.

Como superar a ditadura dos mercados

Sem dúvida alguma, o que se impõe à sociedade vai além da superação do liberalismo, até porque é necessário que se visualize com clareza de que liberalismo se está a falar.

Superar o liberalismo clássico e fora de contexto, chamado neoliberalismo, que se presta ao papel de submeter toda a humanidade aos interesses de algumas forças econômicas, que dominam a política, não é o mesmo que superar o liberalismo social, que coloca o ser humano no centro das políticas de estado e o capitalismo a seu serviço.

A grande demanda teórica que marca o início do século XXI é acerca do papel do estado, mas se dá com base em dogmas e disseminação de propaganda inconsistente. O que deve ser apreciado é a retomada do poder político pela política e isso não se coaduna com as ideias de Smith, pois nos dias atuais a economia assumiu um papel gigantesco, mas não produziu a felicidade tão esperada.

Ao contrário, produziu uma sociedade baseada no tripé: produzir, consumir e enriquecer. Trata-se de uma versão bem pouco criativa do ser humano, cuja sociedade se torna superficial, consumista, hedonista e egoísta, se reconhecendo mais nos objetos que no semelhante. É a sociedade baseada no consumo, que talvez seja o problema a ser superado.

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