O ato de suspeitar e o uso do subjuntivo

o ato de suspeitar e o uso do subjuntivo1
Gramática,

O ato de suspeitar e o uso do subjuntivo

O português é uma das línguas naturais mais complexas do mundo, não há nenhuma dúvida disso. No entanto, o que poucas pessoas sabem é que grande parte dessa complexidade é atribuída ao sistema verbal.

O ato de suspeitar e o uso do subjuntivo

Enquanto a maioria das línguas possuem sistemas verbais bastantes simples, no sistema verbal do português existe uma enorme variedade de tempos e modos verbais, como diversas flexões dos verbos, que devem necessariamente ser levadas em conta na produção de de enunciados inteligíveis e corretos do ponto de vista de gramática normativa.
Neste artigo, será enfocado uma questão que causa muitos erros e dúvidas em estudantes, que do ensino fundamental, médio, superior ou para os candidatos a concurso: o ato manifesto pelo verbo “suspeitar” e o uso do subjuntivo.

Conceito de subjuntivo e conjugação dos verbo suspeitar

Os modos verbais correspondem aos tipos de variações que designam a atitude do falante perante o frase que é enunciada. Assim, o subjuntivo consiste em um modo verbal que corresponde a uma atitude que expressa dúvida, incerteza, algo hipotético, que pode ou não vir a ocorrer.

Dessa maneira, requisito básico desse modo verbal consiste no fato de denotar uma ação que sempre estará ligada a uma outra ação, mesmo que ela esteja implícita no enunciado produzido. Na grande maioria das vezes, essa relação é condicional.

As condições de emprego esse tempo verbal varia conforme o verbo utilizado, pois é necessário lembrar que o verbo é considerado como o núcleo da oração, aquele elemento gramatical que seleciona os predicados e argumentos, e justamente por isso, apresenta o maior número de variações, que podem ser de pessoa, modo, tempo, número, voz e aspecto.

Como neste artigo interesse apenas um verbo, abaixo é apresentado sua conjugação de acordo com o tempo (presente, pretérito imperfeito e futuro) tanto no caso dos pronomes retos (eu, tu, ele, nós, vós, eles) quando no caso do pronome oblíquo (o):
SUBJUNTIVO (com pronome reto)
Tempo presente:
que eu suspeite;
que tu suspeites;
que ele suspeite;
que nós suspeitemos;
que vós suspeiteis;
que eles suspeitem.

Tempo pretérito Imperfeito
se eu suspeitasse;
se tu suspeitasses;
se ele suspeitasse;
se nós suspeitássemos;
se vós suspeitásseis;
se eles suspeitassem.

Futuro
quando eu suspeitar;
quando tu suspeitares;
quando ele suspeitar;
quando nós suspeitarmos;
quando vós suspeitardes;
quando eles suspeitarem.

SUBJUNTIVO (com pronome oblíquo)

Tempo presente
que eu o suspeite;
que tu o suspeites;
que ele o suspeite;
que nós o suspeitemos;
que vós o suspeiteis;
que eles o suspeitem.

Tempo pretérito Imperfeito
se eu o suspeitasse;
se tu o suspeitasses;
se ele o suspeitasse;
se nós o suspeitássemos;
se vós o suspeitásseis;
se eles o suspeitassem.

Tempo futuro
quando eu o suspeitar;
quando tu o suspeitares;
quando ele o suspeitar;
quando nós o suspeitarmos;
quando vós o suspeitardes;
quando eles o suspeitarem.

Com a definição do modo verbal e a conjugação do verbo em questão esclarecidas, é possível partir com mais firmeza para o tópico de interesse deste artigo.

Suspeitar no modo subjuntivo: regras de emprego

Esse tema é de extrema importância pois os erros de emprego do modo verbal incorreto está dentre os mais comuns, tanto na língua falada quanto na língua escrita, revelando que, mesmo sendo o modo verbal capaz de modificar o verbo, essa premissa da língua é desconhecida por grande parte das pessoas.

Observe a oração (1):
Suspeita-se que a cena do crime foi limpa para não despertar desconfiança.
Observando a oração em questão, não é difícil perceber que nela existe uma incerteza, pois ela é manifesta gramaticalmente pelo verbo “suspeita-se”, que indica dúvida. No entanto, ao olhar para o restante da oração, em especial a locução verbal que segue, é possível perceber que “foi limpa” expressa muito mais uma certeza do que uma dúvida.
Assim, é possível perceber claramente que existe um erro na frase, pois o emprego do verbo é conflitante com o emprego da expressão verbal, o que contradiz o que foi dito e, em casos extremos, pode retirar a credibilidade do enunciador. Assim, a razão para esse erro se encontra no fato da expressão verbal não concordar com o modo subjuntivo evocado pelo verbo “suspeita-se”. Reformulando a frase e adequando-a do ponto de vista gramatical, resulta em:
(2) Suspeita-se que a cena do crime tenha sido limpa para não despertar desconfiança.
Assim, o que foi feito na frase (2) foi simplesmente mudar o tempo verbal da expressão verbal que estava conflitando na frase (1): ao invés de indicar uma certeza, ao colocar a expressão verbal no tempo verbal futuro do pretérito, ela passa a indicar incerteza, algo que provavelmente ocorreu, o que consequentemente dá mais coesão à frase.
Vamos analisar outros elementos para que fique mais claro:
(3) Eu suspeito que ele mentiu.
O que ocorre aqui é exatamente o que foi exemplificado no exemplo (1), pois existe uma desconexão entre modo e tempo verbal. Reformulando a frase para que todos seus elementos sejam capazes de expressar a ideia de incerteza requerida por “suspeito”, tem-se:
(4) Eu suspeito que ele tenha mentido.
O mesmo ocorre na frase abaixo:
(5) Ele suspeita que ela vai traí-lo novamente.
A frase adequada do ponto de vista gramatical deve ser:
(6) Ele suspeita que ela possa traí-lo novamente.
Neste caso, o que foi feito foi a modalização da frase pela introdução do “posso”, que não só indica incerteza como também dispensa a necessidade de uma modificação direta no verbo, como feito em (4) e (2).